Escavações polémicas em Jerusalém estão a expor milénios de tesouros religiosos e culturais

Por baixo da Igreja do Santo Sepulcro, no Bairro Cristão de Jerusalém, o padre Samuel Aghoyan contempla uma pedreira contemporânea de Jesus utilizada como cemitério judaico. Um afloramento rochoso nas proximidades é venerado como sendo o Calvário, o monte onde Cristo foi crucificado.

"A passagem apertada situa-se sob um pontão de terra rochoso que se projecta a sul da Cidade Velha de Jerusalém. Esta crista estreita, lugar de implantação da Jerusalém primitiva e hoje atravancado com casas, ocupadas sobretudo por moradores palestinianos, oculta um labirinto subterrâneo de grutas naturais, sistemas de canalização cananeus, túneis judaicos e pedreiras romanas.

Sigo Joe até um espaço recentemente escavado, com a dimensão de uma confortável sala de estar suburbana. A lanterna dele foca-se num cilindro pálido atarracado. “É uma coluna bizantina”, explica, acocorando-se para remover um saco de areia volumoso, em baixo do qual se vê uma superfície branca macia. “E veja este pedaço do chão em mármore.”

Encontramo-nos numa igreja do século V, construída para celebrar o local onde se diz que Jesus curou um cego. O vetusto edifício foi-se juntando aos vastos domínios subterrâneos da cidade.

Para Joel Uziel, a igreja é a mais recente complicação num dos projectos arqueológicos mais caros e polémicos do mundo. A sua missão consiste em escavar uma rua com dois mil anos e 600 metros de comprimento, que outrora conduzia peregrinos, mercadores e outros visitantes a uma das maravilhas da Palestina antiga: o Templo Judaico. Atulhada de escombros durante a feroz destruição da cidade pelas forças romanas em 70 d.C., esta via monumental desapareceu da vista.

Quando a equipa de escavação britânica abriu caminho até entrar na igreja, era vulgar abrir túneis. Hoje, porém, excepto em circunstâncias especiais, a abertura de túneis é considerada perigosa e não científica. Neste ponto, porém, não é prático escavar para baixo a partir da superfície, uma vez que vivem pessoas poucos metros acima. Por isso, um exército de engenheiros e operários de construção civil está a abrir um poço horizontal por baixo da crista. À medida que vão avançando, Joe Uziel e a sua equipa recolhem cerâmica, moedas e outros artefactos. Se o método é cientificamente aceitável ou não, isso depende do arqueólogo israelita a quem se faz a pergunta.

Os operários do túnel lidam com solos instáveis que já deram origem a derrocadas, ao mesmo tempo que os moradores que residem por cima se queixam dos danos causados às suas habitações. O ambicioso projecto, em grande parte financiado por uma organização de colonos judaicos, localiza-se num sítio particularmente sensível de Jerusalém Oriental: a zona da cidade anexada por Israel em 1967, considerada território ocupado por muitos países do mundo. Aliás, a maior parte das escavações realizadas em tal território são ilegais ao abrigo do direito internacional. Chamada Wadi Hilweh pelos palestinianos, para os judeus trata-se da Cidade de David, o local onde o rei David fundou a primeira capital israelita."

Texto: Andrew Lawler

Fotografias: Simon Norfolk2


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